17 maio 2008

Maratona da Madrugada

Cansada depois de um dia exaustivo de trabalho, a mulher toma um relaxante banho e coloca sua confortável camisola de seda creme com rendas na barra. Deita-se na cama e adormece. Meia hora depois, entra no quarto o marido que há 31 anos divide a mesma cama com ela. Ele tenta não fazer muito barulho, se troca e descansa o corpo ao lado de sua eterna paixão.

(...) Algumas horas se passaram e, como uma trovoada que avança pela janela do quarto, a turbulenta respiração dele atropela os sonhos dela. "Que foi isso?"

ROOOONC

"Ah...". Descabelada e ainda cansada, tenta conformar-se com a passagem do tempo que deixou seu príncipe encantado enferrujadinho...

O que ela torcia para amenizar somente tomava cada vez mais corpo e formava novas variações de som. Poderíamos compor sinfonias a partir daquelas emissões! Graves, agudos, sons entrecortados, pausas que surtiam expectativas... O conhecido desapontamento pelo infindável som foi se tornando insuportável. A tática de dar um empurrãozinho no corpo barulhento usada por tantos anos já não era mais eficaz... Tentou então passar a mão nas costas, nos braços, e nada!

Cerrou os olhos de tal forma que parecia fazê-lo também com os ouvidos, mas apenas parecia. Nada lhe foi útil e cada minuto se tornava uma eternidade.

O último barulhinho dos lábios, que se fechavam e abriam conforme o ar saía, foi a gota d´água. Levantou-se e selou os tão tenros lábios de seu amante com as próprias mãos. Uma pausa! Sim, o silêncio... Ah, como era reconfortante aquela negação do som! Respirou aliviada como se tivesse soado a campainha do ringue. Curtiu aquele momento por mais alguns segundos... Renovou as esperanças de dormir acompanhada de seu grande amor.

Ao soltar os lábios, o rugido da fera adormecida preencheu todo e qualquer resquício de paciência, amor, carinho, afeto... Naquele momento ele voltara a ser não um sapo, mas apenas uma boca que fazia um barulho de tolerância inatingível!

Levantou e, num último apelo, disse com a voz frustrada: "Bom. (pausa). Já vou indo". A reposta que ouviu não foi nada diferente das últimas horas... Virou-se sem hesitar e partiu.

Nenhum comentário: